João Neves Amado: “Um enfermeiro tem de querer o bem do outro e fazer disso uma prioridade na sua vida.”

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Enfermeiro, docente e investigador do Instituto de Ciências da Saúde da Católica no Porto. Chama-se João Neves Amado e assume a sua missão de enfermeiro de corpo e alma: “A missão do enfermeiro é estar sempre disponível para os outros”. Sempre comprometido e profundamente apaixonado pela sua profissão, afirma que é a prevenção e a promoção da saúde que mais o realizam. Criativo e curioso, gosta de inovar e de pensar fora da caixa.

 

Qual é a missão de um enfermeiro?

É estar sempre disponível para os outros. Ser enfermeiro é trabalhar em prol de um outro que não o próprio. Existe esta profunda e completa ligação entre a missão do enfermeiro e aqueles que são os valores da Universidade Católica.  Um enfermeiro tem de querer o bem direto do outro e fazer disso uma prioridade na sua vida.

 

“Os enfermeiros também estão nas escolas, nas instituições e nas casas das pessoas.”

 

O que é que o fez querer ser Enfermeiro?

A escolha da Enfermagem foi algo muito natural da minha vida. Tanto o meu pai, como a minha mãe são profissionais de saúde e, por isso, tanto a Enfermagem, como a Medicina foram o meu berço. A minha mãe, enfermeira de saúde pública, falava com grande afeição da importância e da diferença positiva que uma deslocação a casa de cada família que acabava de acolher um bebé tinha para promover a saúde de todos e o quão importantes são estes pequenos gestos. No caso do meu pai, que é médico, admiro esta total disponibilidade para os outros e o seu trabalho pelo estudo das populações e pelo trabalho de sistematização de registos de cancro em Portugal. Eu cresci com estas realidades muito presentes e, por isso, considero que o meu caminho pela Enfermagem aconteceu de forma muito natural. Lembro-me que algures no secundário, quando eu refletia acerca do caminho que devia seguir, procurei que a minha opção pela área da saúde não se limitasse a uma atuação no tratamento das doenças, mas sim que incidisse numa oportunidade de contribuir para a saúde da população pelo caminho da prevenção e pela promoção de estilos de vida saudáveis.

 

Um enfermeiro tem, por isso, uma atuação muito mais vasta do que aquela que é reconhecida pela maioria das pessoas?

Um enfermeiro, para além do papel importantíssimo que tem no tratamento de doenças, tem um papel essencial na promoção de estilos de vida saudáveis. Um enfermeiro tem de ser um exemplo dessa atuação. Os enfermeiros estão em todo o lado e não apenas e só nos hospitais. Os enfermeiros, também, estão nas escolas, nas instituições e nas casas das pessoas. 

 

Estudou na Escola Superior de Enfermagem da Imaculada Conceição, a escola que foi integrada pela Universidade Católica em 2006.

Sim, estudei Enfermagem na Escola da Imaculada Conceição e é importante o local onde estudei, porque foi nesse lugar onde encontrei realmente uma partilha de valores. É uma escola que é hoje o atual ICS e que leciona desde 1935 e, por isso, estamos a falar de um histórico muito grande. É um local onde se aposta na intervenção na comunidade e onde se está, verdadeiramente, atento a novas estratégias inovadoras de abordagem no ensino. O curso foi uma grande experiência de vida, porque não se trata apenas de conhecimentos adquiridos para uma atuação profissional, mas são, também, ferramentas para agir no dia-a-dia.

 

A docência e a investigação vão ao encontro daquilo que mais gosta?

Sim, quando eu percebi que queria atuar nas áreas da prevenção e da promoção da saúde fui tentando procurar ou selecionar as opções. Na altura, uma das propostas que me fizeram foi a de eu poder integrar um novo serviço inovador que é o atual Centro de Enfermagem da Católica, que alia a prática do dia-a-dia da Enfermagem, na prestação de cuidados à população, com a componente da docência e da investigação. Foi este o caminho que fui escolhendo e do qual falo com brilho nos olhos, porque a Enfermagem é a minha vida, é nisso que penso todos os dias e é um privilégio poder assumir esta missão para com os outros.

 

“É essencial esta capacidade que a Católica tem de continuar a promover esta inovação, mantendo toda a tradição e todo o conhecimento.”

 

De que forma é que a docência e a investigação o desafiam?

A docência é uma forma de podermos contribuir para que exista conhecimento da ciência da Enfermagem nas próximas gerações de profissionais, mas é, simultaneamente, um processo complexo que envolve, obrigatoriamente, uma relação entre pessoas e é um envolvimento mútuo, que faz da docência uma atividade muito cativante. Foi através da docência que me fui obrigando a aprender a gerir aprendizagens, a aprender e a ser elemento de aprendizagem para os outros. Costumo reforçar aos alunos, nomeadamente no ensino clínico de intervenção na comunidade, que somos elementos da mesma equipa, que exploramos e aprendemos juntos. A investigação vem completar a minha vocação de ser professor. Trata-se da necessidade de explorar vários aspetos e de procurar a razão de algo acontecer de uma maneira para melhor se atuar no futuro, com vista a beneficiar outras pessoas e comunidades. A investigação é uma busca incessante pelo conhecimento! Sinto que, cada vez mais, precisamos de dar estas ferramentas aos nossos estudantes, porque serão elas que lhes permitirão ser autónomos e críticos de tudo o que o futuro lhes vai reservar.

 

Como é que se ensina a Enfermagem e o cuidado pelo outro no ICS-Porto?

A Enfermagem aqui ensina-se fazendo. Sendo exemplo! Ensinar Enfermagem na Católica caracteriza-se pelo cuidado ao outro, este darmo-nos aos outros, o estarmos sempre disponíveis para os nossos estudantes. Ensinamos Enfermagem através da proximidade que temos com os nossos alunos e o exemplo que todos os dias tentamos ser. É a nossa forma de ensinar.  No futuro, os nossos estudantes serão certamente nossos colegas e vão sê-lo mantendo esta forma de estar, mas podendo progredir e inovar, melhorando sempre o conhecimento desta ciência da Enfermagem e, isso também só é possível com a componente da investigação. É por este motivo que a proposta que se faz aqui na Católica é tão inovadora, porque integramos todos os ciclos de estudo, promovendo este contacto entre estudantes de licenciatura, mestrado e doutoramento com diferentes especialidades. É essencial esta capacidade que a Católica tem de continuar a promover esta inovação, mantendo toda a tradição e todo o conhecimento adquirido até aqui. Neste modelo, onde sou também alumni, existe uma visão marcada pela atenção aos outros que é essencial no ensino da Enfermagem. Para além disto, estimulamos o envolvimento comunitário, articulando o próprio ensino, a responsabilidade social e a investigação.

 

“Temos o dever de atuar junto das populações vulneráveis, promover a literacia, prestar cuidados de saúde, sermos agentes de mudança.”

 

Para além de muitas formações realizadas dentro da área da Enfermagem, também, frequentou o Curso Geral de Gestão da Católica Porto Business School …

Foi, efetivamente, uma experiência interessante e foi um desafio imenso, porque é uma área que me é muito útil e, também, que aprecio muito. Foi nesta formação que tive oportunidade de compreender e de ter conhecimento de muitas coisas que não foram abordadas na minha formação académica anteriormente. Esta multiplicidade de saberes só nos pode ser muito benéfica! Este curso foi também essencial para suportar as várias atividades de gestão que me têm sido solicitadas no âmbito da minha prática profissional.

 

“Guia-me uma formação cristã católica com um sentido de missão.”

 

Quais são os grandes desafios da Enfermagem no mundo de hoje?

A literacia em saúde é um grande desafio. É preciso orientar a sociedade para escolhas saudáveis e opções informadas. Existe um grande número de informação disponível e é preciso saber diferenciar para se escolher de forma ponderada. Temos de perceber o motivo pelo qual um determinado utente não foi à segunda dose de uma vacina. Será que tinha medo? Será que não tinha horário disponível para se deslocar a um centro de vacinação? Será que ouviu alguém a dizer que fazia mal? É através da promoção de uma literacia em saúde que conseguimos informar de forma correta as pessoas para que estas possam ser capazes de tomar decisões conscientes. Outro grande desafio é a dignidade do cuidar, porque apesar da tecnologia, nada irá substituir a interação com o outro e as relações que se estabelecem. É preciso que todas estas competências sejam desenvolvidas e nunca descuradas, porque é neste contacto próximo que podemos fazer a verdadeira diferença. Os enfermeiros, nos cuidados que prestam e nas suas atividades de promoção e prevenção da saúde, são, também, agentes no combate às desigualdades sociais. É importante que lutem pelo acesso aos cuidados de saúde de qualidade para todos.

Do ponto de vista da instituição, temos também como um grande desafio o estabelecimento de parcerias, promovendo uma cada vez maior abertura ao exterior. É fundamental trabalharmos para uma comunidade que ultrapassa as barreiras do campus da universidade onde nos inserimos. É importante envolver os parceiros da comunidade e criar laços que representem melhorias bidirecionais. Temos o dever de atuar junto das populações vulneráveis, promover a literacia, prestar cuidados de saúde, sermos agentes de mudança. Este é um grande desafio, mas tem de ser a nossa prioridade.

 

“Aplico a minha criatividade para cativar os alunos para uma aprendizagem mais enriquecida.”

 

O que é que o move?

Guia-me uma formação cristã católica com um sentido de missão e de me dar aos outros. Complementarmente, motiva-me muito o criar e o inovar. Move-me o cuidar com sentido de missão. A minha missão é ser quem eu sou e estar ao serviço dos outros dessa forma: seja como pai, marido, enfermeiro ou professor.

 

Na sua profissão e nos seus tempos livres o que é que o diverte?

Em criança, eu dizia que queria ser inventor e, por isso, sempre gostei de criar coisas.  Profissionalmente, aplico a minha criatividade para cativar os alunos para uma aprendizagem mais enriquecida e para na minha investigação ser mais fora da caixa. Nos meus tempos livres, o meu maior gosto é dar asas à imaginação: gosto de criar objetos, gosto de fazer trabalhos manuais e de fazer construções em Lego® ou robótica. Também gosto muito de passear para conhecer novos lugares e contactar diretamente com a natureza. Gosto de andar de bicicleta e jogar voleibol, que foi o meu desporto, embora agora já não tenha o tempo disponível que gostaria, mas ainda assim privilegio-os nos meus tempos de férias.

 

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28-04-2022