Manuel Fontaine: “Para entender o Direito, temos de entender a humanidade!”

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Devorador de livros desde criança e com origens familiares belgas, Manuel Fontaine achava que em adulto seria Engenheiro. Mas, afinal, não! O Direito acabou por ser uma surpresa na sua vida e é nesta área que se sente, verdadeiramente, feliz. Alumni da Universidade Católica e com especial gosto pela área do Direito Público, foi reconduzido como diretor da Escola do Porto da Faculdade de Direito pelo 4º mandato consecutivo. Assume que encara este cargo como uma “missão” e que se trata de um “trabalho extremamente aliciante”. A Inovação é uma das palavras de ordem do seu mandato e garante que a Escola do Porto está na “crista da onda do progresso no ensino do Direito”.

 

Quais são as grandes transformações que estão a acontecer na área do Direito?

As grandes transformações são a europeização/internacionalização e a digitalização. O Direito passa a ter de regular estes aspetos da vida comum e é essencial que a faculdade ofereça formação a este nível. Outro aspeto importante tem a ver com a prática do Direito. Como é que o mundo digital transforma o modo como os juristas, advogados e os juízes trabalham? Por exemplo, os advogados poderão ter de realizar menos tarefas repetitivas em massa e passarão a dedicar mais tempo ao raciocínio jurídico propriamente dito, isto é, na criatividade e na interpretação da lei. E o que é que isso significa para o nosso ensino? Significa que nós temos de saber dar resposta a estas necessidades, fomentando não só o raciocínio, mas, também, a criatividade, a capacidade de argumentação e de negociação.

 

Perante estas transformações, como é que olha para o Futuro do Direito?

Com grande entusiasmo! Procuramos estar e estamos, realmente, na crista da onda do progresso no ensino do Direito. Há dois anos, antes da pandemia chegar a Portugal, alguém me dizia com alguma graça “vem aí um tsunami” e eu “é verdade, mas o que precisamos é de surfar o tsunami!” e, portanto, o que precisamos é de fazer face às transformações que ocorrem com energia e vontade de aproveitar as oportunidades, projetando a Faculdade de Direito para o futuro!

 

É diretor da Escola do Porto da Faculdade de Direito desde 2013. Como é que encara este cargo?

Encaro como uma missão. É uma missão ao serviço dos nossos estudantes, ao serviço dos docentes e colaboradores e, claro, ao serviço da Universidade Católica. Apesar de todos os sacrifícios que a função exige, é, sem dúvida, um trabalho extremamente aliciante porque vejo passar à prática as ideias que temos e que ajudam a melhorar e a fazer crescer a faculdade.

 

“O segredo está nas pessoas que estão à nossa volta e com as quais trabalhamos.”

 

Que balanço é que faz dos seus dois últimos mandatos? 

Há uma frase que eu não esqueço do Presidente do Futebol Clube do Porto, clube do qual eu sou adepto. Numa entrevista que lhe fizeram, perguntaram “Qual é o segredo do seu sucesso?” e a sua resposta foi “o segredo do sucesso é rodear-me dos melhores”. Isto marcou-me, porque é precisamente aquilo que acontece também no cargo que eu ocupo e é isso que também marca estes últimos mandatos. O segredo está nas pessoas que estão à nossa volta e com as quais trabalhamos.

 

Quais foram as principais conquistas do trabalho desenvolvido ao longo dos últimos anos?

Ao longo destes dois últimos mandatos fizemos uma aposta grande no corpo docente. Empenhamo-nos em promover a formação dos professores que já cá estavam connosco e em contratar, também, docentes de outras universidades. Acredito no potencial da diversidade e, hoje, posso afirmar que temos um corpo docente mais sólido. Para além disto, também é importante referir que houve uma aposta na renovação do corpo de funcionários. Tudo isto é imprescindível para o sucesso destes anos. A Dupla Licenciatura em Direito e em Gestão marca também estes últimos anos, porque reflete a aposta na interdisciplinaridade e porque constitui um projeto completamente inovador, tão inovador que não existe nada igual a nível nacional e com tanto sucesso. Apostamos, também, na criação de um centro de investigação nacional - que até já recebeu por duas vezes a avaliação de Muito Bom pela FCT – e apostamos, também, numa maior abertura e numa maior colaboração nacional. A Faculdade de Direito da Universidade Católica é uma realidade nacional, constituída pela Escola do Porto e pela Escola de Lisboa, e esta colaboração deve ser mantida e fomentada, razão pela qual continuará a ser, também, uma das prioridades para o meu próximo mandato.

 

Como é que se dá a descoberta do Direito na sua vida?

Isso é muito curioso, porque o que estava nos meus planos era seguir Engenharia Eletrónica. Até que, quando comecei a projetar a minha vida e a pensar que ia entrar em breve na universidade, me apercebi de que, afinal, não é era bem o que eu queria. Embora, também não soubesse o que queria realmente! Acabei por constatar que as disciplinas que eu mais tinha gostado no secundário eram as de filosofia e de português e que talvez o meu caminho fosse por aí…. Foi neste contexto que se colocou a hipótese do Direito. Na altura, a Católica no Porto oferecia a possibilidade de se frequentar um ano zero, que equivalia ao 12º ano. Acabei por me candidatar, ainda sem saber bem se era o que eu queria. A verdade é que no final do 1.º ano do curso tive a certeza de que esta escolha, um bocadinho arriscada, tinha sido a acertada! Senti que estava no caminho certo.

 

Será que em criança já algo indiciava de que a sua área era a das humanidades?

Pode-se dizer que eu era o protótipo daquilo que se chama de nerd, não é? Adorava ler, devorava tudo o que eram livros. Os meus pais tinham uma biblioteca muito diversificada em casa e, portanto, sempre fui habituado a ler e em várias línguas. A minha mãe é belga e, por isso, a minha língua materna foi o francês e, quase ao mesmo tempo, o português. Mas, para além disto, fiz aquilo que todas as crianças fazem: o meu desporto era o Ténis e gostava de carros! 

 

“O direito situa-se entre a ciência, a técnica e a arte.”

 

Pode-se concluir que o Direito foi uma descoberta surpreendente?

Sim, foi uma grande surpresa para mim. Especialmente para mim que, anteriormente, achava que ia seguir Engenharia e que tinha feito o liceu com disciplinas de Eletrónica, Física, Química. Mas acabei por sentir que estava, realmente, no sítio certo. Gostei imenso de fazer o curso principalmente porque o Direito tem uma imensa vertente humanista. Em Direito, ao contrário do que a maioria das pessoas pensa, não se decoram as regras dos códigos porque para isso temos os códigos ao nosso lado. O que aprendemos é o seu enquadramento. O direito situa-se entre a ciência, a técnica e a arte. Para conseguirmos entender devidamente o Direito e para o conseguirmos aplicar, temos de entender a humanidade.

 

Foi reconduzido como diretor da Escola do Porto da Faculdade de Direito para o triénio 2022-2025. Quais são os principais desafios do mandato que agora começa?

Um dos primeiros desafios tem que ver com o ensino online e com a forma como aproveitamos as oportunidades que a pandemia nos trouxe.  O ensino online é uma grande oportunidade, mas ainda temos de perceber qual é o equilíbrio adequado entre o ensino presencial e o online. Este vai ser um dos grandes desafios para os próximos 3 anos. Outro dos desafios é o da internacionalização. Neste mandato queremos aumentar a oferta formativa em língua inglesa, para que possamos captar mais alunos estrangeiros, e queremos oferecer LLMs. Para além disto, continuo empenhado em aproveitar uma das grandes potencialidades do nosso campus que é a interdisciplinaridade: uma Dupla Licenciatura em Direito e em Psicologia é uma das metas definidas até 2025. Outro dos objetivos, prende-se com a criação de uma clínica legal, que preste aconselhamento jurídico a pessoas com mais dificuldades económicas. Com esta iniciativa estamos a servir a comunidade e estamos a permitir que os nossos estudantes ponham em prática os conhecimentos adquiridos. Alicerçado a tudo isto, é sempre prioridade e nossa obrigação continuar a manter e a fomentar o ensino personalizado e a proximidade entre toda a comunidade.

 

Enquanto alumni, docente e diretorda Escola do Porto da Faculdade de Direito em que é que considera que estudar Direito na Católica é diferente de estudar noutra universidade?

A Universidade Católica é muito exigente. Não somos uma fábrica de diplomados, nem pouco mais ou menos. Exigimos muito dos nossos alunos porque queremos retirar o melhor deles e aqui reside também a nossa diferença e a vantagem em se estudar connosco. Paralelamente a isto, há um conjunto de fatores, de iniciativas e de oportunidades que fazem com que estudar na Católica seja uma opção de valor: o ensino personalizado e de proximidade; a possibilidade de se estudar num campus multidisciplinar; o International Law Program, que oferece aos estudantes a possibilidade de frequentarem um conjunto de cadeiras em língua inglesa; muitas iniciativas que promovem o desenvolvimento de diferentes competências, como o ADN Jurista; um programa de transição do ensino secundário para o ensino superior; a oferta de um grande número de cadeiras opcionais, permitindo que os alunos possam organizar o seu percurso e o seu plano de estudos; o apoio na transição para o mercado de trabalho; e entre outros.

 

Isso implica que a Escola do Porto da Faculdade de Direito esteja em constante inovação …

A Faculdade de Direito tem a inovação no seu ADN! Estamos constantemente a pensar no que é que podemos fazer de diferente para incrementar valor à nossa oferta. E para sabermos o que é que temos de transformar temos de compreender o que se está a transformar à nossa volta.

 

“Desempenho uma atividade que me realiza imenso e que me faz gostar do que faço todos os dias, venho sempre para a universidade com muito entusiasmo.”

 

Quer seja no seu trabalho, enquanto diretor e enquanto docente, ou quer seja na sua vida pessoal, em sua casa, com a sua família e nos seus tempos livres, o que é que realmente o anima?

Acho que a questão é muito mais simples do que essa, porque eu não tenho motivo algum para o desânimo.  Desempenho uma atividade que me realiza imenso e que me faz gostar do que faço todos os dias, venho sempre para a universidade com muito entusiasmo. E, claro, na minha família sou intensamente e verdadeiramente feliz. Como é que nestas circunstâncias poderia andar desanimado? Para além disto, há algo fundamental para mim que é a fé. Tenho fé de que alguém cuida de nós e eu só posso estar muito agradecido.

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20-01-2022